20/02/2013

Uma alternativa para a questão das ICGs


O artigo abaixo é de autoria de Mauricio Dester. Por deferência gostaria de apresentá-lo no início e não ao final do artigo(como na publicação original). Acredito que desta forma valorizamos mais ainda as ideias por ele apresentadas. 

Mauricio Dester é graduado em Engenharia Elétrica (Unicamp-FEEC, 2001), mestre em Engenharia Elétrica, linha de pesquisa em Estabilidade de Tensão (Unicamp FEEC, 2006), doutor em Planejamento de Sistemas Energéticos, linha de pesquisa em Política Energética (Unicamp-FEM, 2013). Trabalha em Furnas, na área de Operação de Sistemas de Energia Elétrica, há 30 anos.

Mauricio Dester tem uma visão deste assunto muito parecida com a deste blogueiro. Seu artigo trata de forma muito justa as intenções originais da inclusão das ICG's e não poupa argumentos à necessidade de maior planejamento e agilidade por parte dos envolvidos na licitação e implantação das instalações compartilhadas. Reconhece ainda a incapacidade do Estado de prover obras estruturantes em curto prazo e oferece uma solução interessante de passagem de responsabilidade ao empreendedor sem para isto criar mais entraves à iniciativa privada. Acredito, no entanto, que ainda estamos distantes de obter a necessária integração entre empreendedores para que a "SPE da ICG" opere de forma satisfatória. 

Confesso que sobre este tema tenho mais dúvidas que certezas: 
  • Como o empreendedor poderia prever o seu custo de ICG na tarifa? 
  • Como ANEEL e EPE podem auxiliar na correta avaliação destes empreendimentos evitando elevação exagerada na tarifas?
  • Cabe uma nova regulamentação para este procedimento? 
  • Como proteger o investimento dos empreendedores na transmissão diante da possibilidade de que, sob a justificativa do menor custo global, outros empreendedores possam aproveitar-se da capacidade de transmissão extra reservada aos futuros projetos dos empreendedores envolvidos? 

Apesar dos questionamentos, acredito que a ideia tem viabilidade. Meu sincero agradecimento ao Maurício por seu artigo muito esclarecedor. Convido a todos para ler e opinar sobre o tema. Segue o artigo postado originalmente no Jornal da EnergiaBoa leitura.  

Para estimular a integração da geração distribuída (GD) ao Sistema Interligado Nacional (SIN), foi instituída a figura das instalações compartilhadas de geração (ICGs). Trata-se de um mecanismo destinado a viabilizar os projetos de GD, do ponto de vista técnico e econômico. Este mecanismo, contudo, não representa uma solução de compromisso com os aspectos de estabilidade e confiabilidade do SIN e não foi estruturado de forma a incorporar uma visão de longo termo para a questão da GD.

Como consequências do modelo adotado, nota-se um descompasso entre a entrega para operação das ICGs e as usinas que delas farão uso. Por exemplo, em 2009, no primeiro leilão exclusivo para a energia eólica, foram contratados 1.841 MW de potência instalada. Deste montante, 622 MW estão entregues para operação, todavia impossibilitados de gerar devido às respectivas ICGs ainda não estarem concluídas. O problema tende a se agravar, pois existem discrepâncias entre os cronogramas de conclusão de novas usinas e suas respectivas ICGs. Estes fatos são resultado de uma visão segmentada no processo de planejamento da expansão e que repercutirão de forma negativa na operação do SIN, seja nos aspectos econômico, seja naquelas relacionados à segurança, confiabilidade e ao meio ambiente. 

A saída para esta questão passa por uma mudança na forma de contratação das ICGs. Uma possível solução é integrar o empreendimento de uma determinada ICG às usinas que se conectarão a ela e delegar o ônus e a responsabilidade do projeto e construção desta ICG aos agentes proprietários das usinas que farão uso da ICG. Certamente estes agentes devem avaliar os custos que lhe caberão, em função desta responsabilidade, para que o lance realizado no leilão considere estes custos. Entrando no detalhamento da proposta, deve haver a constituição de uma SPE pelos agentes usuários, cujas participações devem ser estabelecidas previamente, em relação ao leilão. Esta SPE será a responsável, de fato, pela ICG. Os critérios para divisão do aporte de capital para a constituição da SPE devem estar atrelados ao montante de energia contratado pelas respectivas usinas usuárias da ICG. Deve ainda regulamentar-se a liberação da entrada em operação destas usinas, que somente deve aceita se a respectiva ICG estiver também liberada. Mesmo procedimento deve ser adotado com a conexão da usina até a ICG, assim como em relação à conexão desta até a rede básica. Para aumentar ainda mais a segurança no que concerne à disponibilidade da ICG no prazo certo, a parte do capital destinado a SPE e suficiente para a conclusão da ICG pode ser requerida em conjunto com o depósito de garantias para a participação dos leilões.

Após o comissionamento, a ICG deve, então, ser doada para o agente proprietário do ponto de conexão à rede básica. Este, por sua vez, passa a ser, a partir de então, responsável pela operação e manutenção da ICG, sendo remunerado por meio de uma RAP correspondente e devidamente dimensionada considerando esta situação específica. Seria algo semelhante do que já se pratica no que se refere ao acesso à rede básica por consumidores livres. A partir deste momento a SPE pode ser dissolvida, uma vez seu propósito já ter sido alcançado. Alguns cuidados especiais devem ser tomados, por parte do órgão de planejamento. Um deles é requerer no projeto da ICG a possibilidade de serem efetuados reforços, de forma que se possa prover conexão a empreendimentos futuros de GD, já previstos ou com potencial de se efetivarem na região onde a ICG estiver localizada. Esta proposta pode impactar nos valores da energia comercializada nos leilões, entretanto há que se contrapor este ônus com aquele que pode advir da não disponibilidade da energia elétrica e que hoje já é arcado pelos consumidores ligados ao SIN.


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